Se já sei a resposta, nem faço a pergunta. Eu disse, na primeira contração de diafragma da reunião toda. Na sala de espera, a inquisição. Você tá carrancudo. Tem dormido? Não trabalha demais, ok? Precisa cuidar do coração. E então? Então nada. Deixo o prédio e ligo o celular no café da esquina. Uma mensagem sua pipoca dizendo que vai ficar tudo bem.
Se não sei a resposta, faço todas as perguntas. Amar é livrar-se do peso de viver? É o remédio? A redenção? O final? A descoberta de que o samba não morreu? Me diz. Me diz, garçonete que traz meu pingado fervilhando. Amar apenas por cansaço de estar só é trair a si mesmo, né? Será? Eu me pergunto. E fico no ar. Por isso voo na rota desse amor.
A garçonete ajeita os guardanapos com seus olhos incas meio que perguntando: você disse amor? Sim. É quando alguém, feito de som, cheiro, forma e movimento materializa os sonhos presos na garganta. Quem é capaz de resistir? Quem não se deixa vendar os olhos pela própria vontade? Sei que é amor quando não consigo definir o sentimento pela pessoa.
Ela volta pro balcão, com os estampidos jocosos das tamancas ecoando mais perguntas. Mas como, se você só a conheceu há treze dias? Ela nem mora aqui. E a diferença de idade? Mas você a viu pela primeira vez na internet. E tão diferente. Onde tá escrito? Não me parece a pessoa certa. Parece impulso. É, eu sei. Mas eu é que sei.
Depois de tantas pessoas certas que apareceram na hora errada veio ela, a pessoa errada na hora certa. Provocação, utopia, desordem, incomum. A leveza e o peso, o caos e a poesia bebendo no mesmo copo, em harmonia. Esperamos nos prender pra ficar livres e buscar todas as outras coisas. Agora eu começo a dieta. Agora eu vou provar vinhos. Agora eu vou gostar mais das pessoas. Agora vou ao Cristo Redentor ou à pracinha da esquina.
E eu só queria dormir mais horas. Mas seu carinho nas costas com a perna nua enlaçada me sopra as fagulhas. Depois de tanto tempo a realidade supera os sonhos. Antes não conseguia dormir, agora já não quero sonhar. Durmo em paz com a insônia depois de sentir a cara dura se desintegrando com seu olhar ao passo que falo sentimentalismos por impulso.
Fazer o quê? São os impulsos que determinam nosso futuro. Não há erro antes de errar. Não há fracasso se não há escolha. Não há resposta sem pergunta. Não há promessa sem dívida. Olhos vendados. Sem pressentimentos. E o amor não tem erro, escolha, futuro, perguntas. O resto a gente vê depois, quando cair o pano.
Todo romance só vale a pena por sua fascinação, que reside nas coincidências, nos impulsos, na obediência, no senão, na obrigação de reagir a um encontro, na pessoa errada. Atribuir uma resposta, um sentido, uma razão, medir a intensidade, definir o amor, prever o futuro é pretensão de quem sabe amar. Mas não sabe que amar é não saber.
domingo, 12 de junho de 2011
terça-feira, 1 de março de 2011
Arquipélago
Cedo demais pra dizer, mas hoje ela acordou se sentindo diferente. Lavando o único rosto pelo qual era apaixonada até ontem, calçando seus pés que se arrastam na frente, maquiando os bocejos que a normalidade provoca. Reunião, banco, supermercado e sem-número de compromissos. Paralisa diante do espelho para refletir. Uma blusa, uma sombra, uma revisão nas axilas, um gargarejo ensaiado das coisas que precisa falar a pessoas com quem não deseja estar.
Ontem ela riu sentada em cima dos tornozelos nus no meu sofá-cama, aspirando o hálito de chuva que vinha da janela. Sentiu tesão e também que a vida podia ser maravilhosa noite sim, noite talvez. Já bem cedo de manhã, ela sente-se presa em círculos sociais viciosos. Falas amenas, tapas nas costas, risos agendados, poses corretas, unhas feitas, cabelos penteados. Nem um pouco a fim de trocar ideias, dar opiniões, perguntar horas, gestos óbvios, olhares diretos de gente que conversa olho-nos-peitos. Quer ser mandado às favas? Comente do tempo. Ela prefere esperar o que os pássaros verdes vão dizer.
Ela é assim, pertence só a quem quer pertencer. Não faz questão de pisar no que bóia na superfície de alguém, rir sem graça de piada formal e comedida. Por isso rodeia, rodeia e rodeia, e se faz tonta como uma pedra de gelo imersa no uísque amargo de um copo sem profundidade. E me contou, nem gosta de uísque. E não crê em horóscopo do dia, mas queria mesmo que ele dissesse, só hoje, que eu ligaria mais tarde pra dizer que vai ficar tudo bem e a gente vai se ver depois ou amanhã. Em intervalos, procura meu rosto na coluna social, na esperança de me encontrar num anúncio de amor, dizendo que preciso sim e urgentemente dela. Eu não disse isso ainda, mas penso nela de quando em quando. Toda noite.
Ela pega um café e tenta não roer a unha do dedão, enquanto passa o dia planejando os riscos do que já nasceu pra dar errado. Coisas a ver com dinheiro, conexões e vantagens. E recebe abraços comerciais, mesmo com preguiça de relações mercadológicas. Abre a gaveta, belisca uma bolacha molenga e sente-se um pouco sozinha, tipo uma ilha. Isso, uma ilha. E todos passam por ela sem perceber que aquele aflito é um amor disfarçado, tomando aquele corpo. Acha que não crê em deus, e quase mais ninguém, mas realmente acha que às vezes deus se manifesta em forma de suspiro coberto de chocolate.
Anda tão assustada com as pessoas, logo exausta de tudo, de juntar entulhos de construções mal-feitas. Não quer esperar mais nada da primavera. Nada de amores infinitos, laços presos, casórios, fusões, longas viagens, destinos imutáveis. Nessa altura dos dias, o amor não passa de uma mão quente, sexo seguro, boas risadas e algumas faixas de Simon & Garfunkel. Só não abre mão de largar aquele eterno gosto análogo de cigarro e vodca na boca seca.
Sua exigência solitária é poder, um dia, atravessar a rua sorrindo, abraçar forte e poder dizer que, putz, foi gostoso aquele nosso tempo. Aquele, quando depois de uma tempestade transatlântica, uma ilha encostou em outra ilha, mudou radicalmente o desenho da geografia e, juntos - pelo menos por um bom tempo - formaram um arquipélago desses azul, bem bonito.
Ontem ela riu sentada em cima dos tornozelos nus no meu sofá-cama, aspirando o hálito de chuva que vinha da janela. Sentiu tesão e também que a vida podia ser maravilhosa noite sim, noite talvez. Já bem cedo de manhã, ela sente-se presa em círculos sociais viciosos. Falas amenas, tapas nas costas, risos agendados, poses corretas, unhas feitas, cabelos penteados. Nem um pouco a fim de trocar ideias, dar opiniões, perguntar horas, gestos óbvios, olhares diretos de gente que conversa olho-nos-peitos. Quer ser mandado às favas? Comente do tempo. Ela prefere esperar o que os pássaros verdes vão dizer.
Ela é assim, pertence só a quem quer pertencer. Não faz questão de pisar no que bóia na superfície de alguém, rir sem graça de piada formal e comedida. Por isso rodeia, rodeia e rodeia, e se faz tonta como uma pedra de gelo imersa no uísque amargo de um copo sem profundidade. E me contou, nem gosta de uísque. E não crê em horóscopo do dia, mas queria mesmo que ele dissesse, só hoje, que eu ligaria mais tarde pra dizer que vai ficar tudo bem e a gente vai se ver depois ou amanhã. Em intervalos, procura meu rosto na coluna social, na esperança de me encontrar num anúncio de amor, dizendo que preciso sim e urgentemente dela. Eu não disse isso ainda, mas penso nela de quando em quando. Toda noite.
Ela pega um café e tenta não roer a unha do dedão, enquanto passa o dia planejando os riscos do que já nasceu pra dar errado. Coisas a ver com dinheiro, conexões e vantagens. E recebe abraços comerciais, mesmo com preguiça de relações mercadológicas. Abre a gaveta, belisca uma bolacha molenga e sente-se um pouco sozinha, tipo uma ilha. Isso, uma ilha. E todos passam por ela sem perceber que aquele aflito é um amor disfarçado, tomando aquele corpo. Acha que não crê em deus, e quase mais ninguém, mas realmente acha que às vezes deus se manifesta em forma de suspiro coberto de chocolate.
Anda tão assustada com as pessoas, logo exausta de tudo, de juntar entulhos de construções mal-feitas. Não quer esperar mais nada da primavera. Nada de amores infinitos, laços presos, casórios, fusões, longas viagens, destinos imutáveis. Nessa altura dos dias, o amor não passa de uma mão quente, sexo seguro, boas risadas e algumas faixas de Simon & Garfunkel. Só não abre mão de largar aquele eterno gosto análogo de cigarro e vodca na boca seca.
Sua exigência solitária é poder, um dia, atravessar a rua sorrindo, abraçar forte e poder dizer que, putz, foi gostoso aquele nosso tempo. Aquele, quando depois de uma tempestade transatlântica, uma ilha encostou em outra ilha, mudou radicalmente o desenho da geografia e, juntos - pelo menos por um bom tempo - formaram um arquipélago desses azul, bem bonito.
segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011
Encostar na tua
"Eu quero te roubar pra mim
Eu que não sei pedir nada
Meu caminho é meio perdido
Mas que perder seja o melhor destino
Agora não vou mais mudar
Minha procura por si só
Já era o que eu queria achar
Quando você chamar meu nome
Eu que também não sei aonde estou
Pra mim que tudo era saudade
Agora seja lá o que for
Eu só quero saber em qual rua
Minha vida vai encostar na tua
E saiba que forte eu sei chegar
Mesmo se eu perder o rumo, êê
E saiba que forte eu sei chegar
Se for preciso eu sumo
Eu só quero saber em qual rua
A minha vida vai encostar na tua.."
Ana Carolina
Eu que não sei pedir nada
Meu caminho é meio perdido
Mas que perder seja o melhor destino
Agora não vou mais mudar
Minha procura por si só
Já era o que eu queria achar
Quando você chamar meu nome
Eu que também não sei aonde estou
Pra mim que tudo era saudade
Agora seja lá o que for
Eu só quero saber em qual rua
Minha vida vai encostar na tua
E saiba que forte eu sei chegar
Mesmo se eu perder o rumo, êê
E saiba que forte eu sei chegar
Se for preciso eu sumo
Eu só quero saber em qual rua
A minha vida vai encostar na tua.."
Ana Carolina
quarta-feira, 26 de janeiro de 2011
Remar
Eu entro nesse barco, é só me pedir. Nem precisa de jeito certo, só dizer e eu vou. Faz tempo que quero ingressar nessa viagem, mas pra isso preciso saber se você vai também. Porque sozinha, não vou. Não tem como remar sozinha, eu ficaria girando em torno de mim mesma. Mas olha, eu só entro nesse barco se você prometer remar também! Eu abandono tudo, história, passado, cicatrizes. Mudo o visual, deixo o cabelo crescer, começo a comer direito, vou todo dia pra academia. Mas você tem que prometer que vai remar também, com vontade! Eu começo a ler sobre política, futebol, ficção científica. Aprendo a pescar, se precisar. Mas você tem que remar também. Eu desisto fácil, você sabe.
E talvez essa viagem não dure mais do que alguns minutos, mas eu entro nesse barco, é só me pedir. Perco o medo de dirigir só pra atravessar o mundo pra te ver todo dia. Mas você tem que me prometer que vai remar junto comigo. Mesmo se esse barco estiver furado eu vou, basta me pedir. Mas a gente tem que afundar junto e descobrir que é possível nadar junto. Eu te ensino a nadar, juro! Mas você tem que me prometer que vai tentar, que vai se esforçar, que vai remar enquanto for preciso, enquanto tiver forças! Você tem que me prometer que essa viagem não vai ser a toa, que vale a pena. Que por você vale a pena. Que por nós vale a pena. Remar. Re-amar. Amar.
(Caio Fernando Abreu)
E talvez essa viagem não dure mais do que alguns minutos, mas eu entro nesse barco, é só me pedir. Perco o medo de dirigir só pra atravessar o mundo pra te ver todo dia. Mas você tem que me prometer que vai remar junto comigo. Mesmo se esse barco estiver furado eu vou, basta me pedir. Mas a gente tem que afundar junto e descobrir que é possível nadar junto. Eu te ensino a nadar, juro! Mas você tem que me prometer que vai tentar, que vai se esforçar, que vai remar enquanto for preciso, enquanto tiver forças! Você tem que me prometer que essa viagem não vai ser a toa, que vale a pena. Que por você vale a pena. Que por nós vale a pena. Remar. Re-amar. Amar.
(Caio Fernando Abreu)
domingo, 2 de janeiro de 2011
Angústia
Ao longo da minha vida por um grande amor aguardei.
Amor pelo qual viveria,
mataria
e morreria.
Ao encontrar essa linda mulher.
Que a meus olhos é perfeita.
Na verdade é uma qualquer.
Mas que morra mulher maldita.
Não me deixa dormir.
Não me deixa comer.
Não me deixa sorrir.
Não me deixa viver.
Seu coração não é meu.
Piedade não é sentimento digno.
De mim tudo perdeu.
Meu Deus tira de mim esse sentimento malígno.
Por André Moreira
Amor pelo qual viveria,
mataria
e morreria.
Ao encontrar essa linda mulher.
Que a meus olhos é perfeita.
Na verdade é uma qualquer.
Mas que morra mulher maldita.
Não me deixa dormir.
Não me deixa comer.
Não me deixa sorrir.
Não me deixa viver.
Seu coração não é meu.
Piedade não é sentimento digno.
De mim tudo perdeu.
Meu Deus tira de mim esse sentimento malígno.
Por André Moreira
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